Em agosto de 2014, o país foi abalado pela delação de Paulo Roberto
Costa (que esta semana finalmente se livrou da tornozeleira eletrônica e
aparece aqui numa fotomontagem), a primeira a revelar ao país o monumental
assalto aos cofres da Petrobras. O horror desta delação não foi apenas no
aspecto material, embora no frigir dos ovos o que realmente interessa é que
enfiaram a mão no nosso bolso.
Mas, num país em que alcaguetar
nunca foi bem visto, o ex-diretor da Petrobras foi crucificado na época também
neste aspecto moral. Diferenças à parte, ele foi encarado, então, como um novo
Joaquim Silvério dos Reis, que dedurou os inconfidentes em troca do perdão de
sua dívidas com a Coroa.
Antes de virar também delator,
Marcelo Odebrecht, exibia, na cadeia, em Curitiba, asco a este tipo de X-9: “Se
elas (minhas filhas) brigassem, eu perguntasse quem começou, e uma dedurasse a
outra, eu talvez brigasse mais com quem dedurou do que com aquela que fez o
fato.”
Só que de lá para cá tudo mudou.
Acredite. Esta semana, chegou a 70 o número de delações na Lava-Jato (isto sem
falar nas delações coletivas, como a prometida por 50 executivos da Odebrecht).
Aliás, como cada delator entrega, em média, três pessoas, se ninguém quebrar
esta corrente, este número pode dar um salto triplo para 210, 630, 1.890.
Roberto Romano, professor de
Ética e Filosofia da Unicamp, lembra que a banalização de um ato, no caso a
delação, faz com que ele, com o tempo, perca o impacto inicial:
-Vale para tudo. Quando uma
pessoa ganha seu primeiro prêmio é uma alegria especial. Na medida em que vai
ganhando outros e outros, esta sensação tende a perder força. Vira uma coisa
habitual. Ou seja, o que era uma espécie de pecado mortal, daqueles que levam
ao inferno, dedurar, do ponto de vista moral, pode virar um pecado venial, que,
com três Ave-Marias e um Pai-Nosso se perdoa.
Cartas para a Redação. Por Ancelmo
Gois/O Globo – CONFERE
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